Loquaz falacioso
Delírios de uma mente perturbada
quarta-feira, 25 de junho de 2025
sexta-feira, 30 de maio de 2025
ELAINE
Rollin' on an empty bed
Searchin' for your body
Yet you're not there...
So far gone, unworldly
Borderline insanity.
Unbearable sadness
Comforting friend...
Days goes by... relentlessly, unwillingly.
How could you leave me like this?
All alone in this maddening world.
Our dreams shattered forever...
No notice, no warning,
You're gone...suddenly.
segunda-feira, 26 de maio de 2025
Avô é pai duas vezes
O avozinho nunca recorreu ao artifício das pernas de pau.
Hoje lembrei-me dele, não que tal coisa seja rara, muito pelo contrário, mas, há momentos, ao contemplar a clausura das labaredas, encerradas no moderníssimo recuperador de calor cá de casa, tomou-me, sem aviso, a saudade das frias manhãs de Outono passadas a assar castanhas na lareira de pedra da velha casa, essa sim, genuína e plenipotenciária de ostentar o nome.
Quis uma sucessão de acasos que, esta noite, eu tenha por companhia única uma gata branca e por banda sonora a nostálgica percussão da chuva, abundante lá fora. Acendi a lareira, pela primeira vez na estação, na esperança ténue de dissipar o frio causado pela ausência de vivalma e muni a mão direita de indulgente copo de malte.
E, na contemplação das chamas, ouço agora o longínquo crepitar das castanhas da minha infância, tisnadas pela imolação altruísta das cepas de videiras velhas, e lá está o homem alto, apoiado sobre um banquinho de madeira, produto das suas hábeis mãos, a remexer o brasido com um graveto e a povoar a minha imaginação pueril de histórias de bichos e quimeras de África, da África colonial que tanto amava. Façanhas e desventuras de desterrado em Lourenço Marques, como assim se chamava a capital provincial de Moçambique quando o avozinho por lá viveu. Agora que bóiam à tona da minha mente estas inefáveis memórias de infância, imprimem-se-me, em ambas as retinas, as imagens vívidas do imenso espólio de objectos, trazidos ocultados à laia de contrabando dessa África onírica, que havia na velha casa: chifres de impala convertidos em bizarros pássaros pela mão expedita de pretos, que nisto são exímios artesãos, diáfanas freiras mumificadas nas presas de marfim de um qualquer elefante abatido pelo predador branco na refrega da savana, sendo esta particular efígie sinal inequívoco de miscigenação; existiam ainda inúmeras peles de grandes felinos, de tigres e afins. O tempo encarregou-se de lhes dar descaminho. Vivem agora tão-somente nas minhas memórias.
Foi o meu avô que me ensinou a amar a terra.
"Um homem pode não ser farto de oiros e pratas, não possuir no banco a segurança de gorda conta a prazo de vários dígitos, mas pode-se considerar afortunado se conseguir arrancar, de um pedacito de terra a que possa chamar seu, o sustento frugal do pão nosso de cada dia" - repetia-me inúmeras vezes, no intervalo dos vigorosos golpes de enxada com que, carinhosamente, preparava o ventre da terra para receber o sémen do grão. Nestas pausas, eu corria industrioso a chegar-lhe o lenço branco com que enxugava o suor que lhe escorria abundante da fronte ou o cântaro de barro cru que conservava a frescura da água, amenizadora da sede.
Juntos corremos campos e montes, rios e vales; a maior parte das vezes porque a isso obrigava a labuta do campo, outras por diversão como nas raras vezes do ano em que nos levava à praia no velho Ford Taunus - que o mar era longe, o carro cansado e as economias poucas - e no caminho de regresso parávamos a saciar-nos, sob o abrigo frondoso de uma centenária árvore, com a frescura de um melão ou melancia comprados a um qualquer vendedor ou vendedeira, destes ocasionais que se encontram à beira da estrada quando a época é abundante de frutas.
Disse-te, um dia, na pureza do meu coração de menino de dez anos, que queria morrer no mesmo dia que tu. Que nos lançaríamos juntos nessa nova aventura de desbravar o desconhecido dos mundos d'além morte. Tu foste; eu, porém, fiquei. Encontrar-nos-emos um dia?
Avozinho, lá onde estiveres agora, perdoa-me a insuficiente homenagem que (e já se apodera de mim a comoção), por mais que me esforce, pecará sempre por escassa. Jamais poderá aflorar o gigante que foste aos olhos deste que para sempre te ama. E tu, avô, és das poucas pessoas que ainda arrancam baptismais lágrimas de contrição ao meu, entretanto por força de mundanas circunstâncias, empedernido coração.
Olho o teu retrato.
Choro agora.
quinta-feira, 7 de março de 2024
Reunião de (con)domínio
Fim de tarde de Março, marçagão.
Soturnamente contemplo ao longe as nuvens que, neste fim de tarde, açoitadas por Éolo, cavalgam céleres, num tropel desenfreado, a linha do distante horizonte. Em pano de fundo, o espaço sideral, tela dominada hoje por tons plúmbeos - espargida porém, aqui e ali, por laivos ígneos de um encarnado menstrual. Toda a cena prenuncia e antecipa o que em breve há-de vir; o breu lúgubre de uma noite tempestuosa, primeva, redentora e baptismal. Alheias a este premonitório cenário, simultaneamente aterrador e fascinante, as pessoas apressam-se, aos magotes, no regresso a casa à medida que o excelso Hélio descreve em arco, impassível, a sua jornada contínua confundindo-se, a espaços, com a turba gasosa no seu trajecto, paulatino e inexorável, para lá do horizonte. Assim é desde tempos imemoriais numa escala de grandeza que a brevidade humana não consegue sequer aflorar.
Debruçado sobre a lareira, partido à altura do ventre numa pose a fazer lembrar Rodin, sinto o peso incomensuravelmente esmagador destas e doutras semelhantes cogitações que me assaltam e inquietam o espírito. Nos antípodas de toda esta metafísica, sugado à terra que nem maçã de Newton, vem-me agora à cabeça a reunião de ontem de condóminos aqui do prédio que culminou em cenas pouco edificantes de peixeirada.
(Neste ponto, socorrendo-me de extensa parentética, convém aclarar - devida vénia aos muitos que têm no Mar o seu sustento e modo de vida através da apanha, recolha e comércio laborioso das suas oferendas diárias - a expressão peixeirada, dizia, assumindo um carácter marcadamente pejorativo, não pretende aqui acarretar qualquer desprimor para essa mui nobre, digna e ancestral actividade cujo fruto do trabalho aprecio particularmente; mas, algures no tempo, convencionou-se dizer assim, pronto, quando um cordato e salutar esgrimir de argumentos entre partes, elevando-se as vozes, depressa se transmuta em nada edificante espectáculo de berraria a roçar, não raro, a boçalidade e o insulto; fim de).
Ora, a reunião de ontem, entre gente dita civilizada - a páginas tantas, não havendo consenso sobre uma qualquer minudência burocrática aquando da lavra da bendita acta - descambou rapidamente em peixeirada e não consigo, revivendo agora a lamentável cena, reprimir um esgar cínico de repúdio, nojo e descrença no bicho Homem. Ah, no grande esquema das coisas, como é ilusória a importância que alguns espécimes humanos julgam ter! Montados no vil metal, intitulam-se, autocraticamente, acima dos demais, humilhando e espezinhando os seus pares! Valha-nos Cronos, o grande equalizador, que tudo e todos submete, sem discriminação, a seu bel-prazer!
No fim, vociferados uns impropérios e trocados uns olhares lancinantes de ódio entre as partes em contenda, lá se refrearam os ânimos e, dado o adiantado da hora, dissolveu-se a excitada assembleia rumando cada qual aos respectivos aposentos, sem que muito de substância tenha ficado decretado.
E, puta que pariu!, tendo participado desta agremiação muito mais espectador que interventivo, ocorre-me agora que a tragicomédia da existência resume-se a isto mesmo; eis o Homem, esse milagre evolutivo bípede, pleno de contradições, concomitantemente capaz de sublime grandiosidade - arte, ciência, reinvenção - e da mais vil, execrável e abjecta baixeza para com o seu semelhante (conflito, guerra, destruição)!
A percussão da chuva, abundante lá fora, reclama-me e prende-me o olhar e num esforço para vencer a penumbra, vislumbro, através das vidraças, duas silhuetas - aparentemente díspares em idade, estatura e condição - rua acima, desafiando curvadas a intempérie e a escuridão. Mais adiante na rua e agora sob a luminária pública, o quadro planta-se mais nítido a meus olhos; mãe e filha, progenitora e prole, braço no braço, amparando-se mutuamente, fustigadas pela chuva, avançam determinadas num esforço derradeiro para recolher a casa. Sinto um calafrio percorrer-me a espinha. No conforto do calor providenciado pela lareira todo o meu corpo estremece e, ao contemplar a cena, reacende-se em mim uma ténue centelha de fé e esperança na humanidade.
sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024
O Senhor J.
quarta-feira, 20 de setembro de 2023
Pensées
sexta-feira, 24 de junho de 2022
FRATERNITÉ
O sangue que me corre nas veias é como o teu. Glóbulos, plaquetas e outras substâncias que tais... Igual ao do hindu, cristão, muçulmano ou ...
-
Há instantes cheirou-me a amores antigos, a paixões perdidas. Sabem quando o olfacto nos trai relembrando-nos odores há muito soterrados no ...
-
O meu avô materno foi um gigante que errou por este mundo de joelhos. Há pessoas assim, discretos colossos maiores que a vida, e depois h...
-
Diz-se que o homem é um animal de hábitos e nisto sou muito homem. Como toda a gente, tenho os meus (que, neste caso e contrariamente ao af...