segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Retalhos da minha aldeia

Lembram-se deste?
Pois bem, a história é simples e seria até hilariante não fora o protagonista um velho amigo de infância. Diagnosticaram-lhe esquizofrenia, toma lá meia dúzia de drunfos para conter as vozes interiores, virou asceta - barba pelo peito, cabelo a ocultar o garrote, sandálias a condizer - e percorre diariamente, sol-a-sol, animado por uma qualquer invisível força interior - as vozinhas outra vez - as ruelas do povoado para estupefacção de uns, temor de outros, desprezo de todos, à passagem de tão volumoso e sinistro vulto.
Ainda agora passou a passos largos ao portão da ti'Alcina, curandeira de renome com créditos firmados até nas aldeias vizinhas, dois "credo em cruz" acompanhados por igual número de benzeduras - protecção divina nunca é de mais num nítido caso de possessão demoníaca como este - e seguiu caminho pelo carreiro da Fonte do Cão acima adentrando-se pelo mato qual bicho acossado por matilha de cães de caça. Só volta ao fim do dia. O que faz nos entretantos permanece um mistério para a populaça e é mote das mais acesas teses defendidas com vigor, inflamado por sucessivos copos de tinto, na taberna do Vadio.
A aldeia é cruel para quem é diferente. Que o diga o Danielzinho, bicha com muito gosto e prazer - o dele, cruzes credo!!! Quando saiu do armário, como é moda agora dizer-se, foi motivo de chacota geral perante o desgosto dos incrédulos progenitores, julgado sumariamente no areópago do Vadio. A mãe talvez já desconfiasse, no seu íntimo, das inclinações do rapaz e, corre à boca miúda, não terá sido alheia à definição sexual, chamemos-lhe assim, da criança já que, desde tenra idade, gostava de lhe vestir trajes de rapariga, que seu ventre até então só parira varões, e este mais novo queria-se menina.

Reunião de (con)domínio

     Fim de tarde de Março, marçagão.      Soturnamente contemplo ao longe as nuvens que, neste fim de tarde, açoitadas por Éolo, cavalgam c...